ANCARA e DAMASCO — Uma confusão no maior campo de refugiados sírios em território turco expôs nesta quinta-feira a dificuldade crescente do governo da Turquia em lidar com alto influxo de civis em fuga da guerra contra o regime de Bashar al-Assad. Testemunhas contam que uma briga no campo de Suleymansah, junto à cidade turca de Alkalay - onde 35 mil pessoas vivem em tendas - fez com que a polícia deportasse para a Síria “centenas de refugiados”. Mas, entre relatos de abusos, violência e provocação, o Ministério das Relações Exteriores negou essas acusações. E assegurou que muitos sírios decidiram cruzar de volta a fronteira de seu país “por vontade própria”.
O Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur) cobrou explicações do governo turco após uma série de denúncias dos moradores do campo, aterrorizados. Uma mulher contou que um grande número de policiais estava no local. A confusão teria se originado de um protesto contra as condições do lugar - depois que as más instalações elétricas causaram um incêndio numa tenda, ferindo três irmãos, um dos quais morreu horas depois.
- Está havendo uma operação de deportação em massa aqui! Eles expulsaram um monte de gente, dois dos meus filhos e e três sobrinhos, filhos do meu irmão. Mandaram que pegassem as malas - disse a mulher, identificada como Saher, por telefone.
Líder da oposição adia renúncia
Uma guerra de versões, então, foi deflagrada. Segundo a Chancelaria turca, câmeras de segurança instaladas no campo flagraram imagens de um grupo de cerca de 200 sírios envolvidos no tumulto, classificado como “uma provocação”. Eles teriam atacado as forças de segurança turcas a pedradas, sem qualquer reclamação ou exigência. A polícia reagiu com disparos de gás lacrimogêneo e e canhões d’água. Na confusão, cerca de 130 sírios cruzaram a fronteira de volta. Por vontade própria, ressalta o governo.
- Os sírios que não estavam envolvidos no ataque reagiram duramente contra os agressores. Pelo menos 130 pessoas, temendo retaliações ou ações legais na Turquia, quiseram o direito de voltar à Síria por vontade própria e foram mandados de volta após os procedimentos oficiais. As notícias de que estamos deportando são falsas - afirmou o porta-voz da Chancelaria, Levent Gumrukcue.
Relatos contrários, porém, continuaram emergindo. Um funcionário do campo disse, em condição de anonimato, que entre 600 e 700 pessoas identificadas como envolvidas na violência foram expulsas. Um outro confirmou a história, mas fixou em cerca de 400 o número de deportados.
- Ainda estão olhando as imagens das câmeras de segurança, e se acharem mais (envolvidos), vão deportá-los - contou uma das fontes.
O episódio ilustra a dificuldade turca em lidar com os cerca de 261 mil refugiados sírios que se aglomeram em 17 campos no país, segundo a ONU. E o número tende a aumentar, conforme a segurança se deteriora no país vizinho. Nesta quinta-feira, morteiros atingiram a cafeteria da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Damasco, matando 15 estudantes.
No campo diplomático, porém, um ganho para a oposição. Após um bem-sucedido discurso na Liga Árabe no início da semana, o presidente da Coalizão Nacional Síria (CNS), Moaz al-Khatib, decidiu adiar sua renúncia. A fontes americanas, ele disse que permaneceria até maio para “cumprir suas responsabilidades”.